11.1.14

Blanche 38: Um eunuco se faz

Domingo à tarde, revertendo a cavalo da propriedade paterna, Blanche se depara com uma zaragata no terreirão frontal da residência de tábuas.
Instintivamente, contorna-a de manso e capta a essência da altercação. Um afeminado eunuco vagara pela temerária floresta, partindo da imensa reserva indígena, detrás da montanha.
Acha-se todo ornado com abrasadas pinturas sacras, portando adereços adelgaçantes, contudo todo ferido e desgrenhado pelos dias ao léu, sem o pajem que o honrava prontamente.
Eunucos são seres meio bruxos, meio deuses, passíveis de ascensões celestiais e descensões infernais; e apenas prescindem de seu espaço imaculado, em apostasia, fugidos ou banidos.
Furibundo, gesticulando e bradando, tenta intimidar a família à procura do doce sabor de conquista, que atônita, prostra-se diante da intensa entidade fantasmagórica. 
Blanche intercepta tamanho arroubo ainda montada, e imperiosamente comunica-se na língua indígena com o feiticeiro, de imensos e harmônicos cabelos zainos.
Este, assustado, deixa a “máscara" e implora auxílio. Encontra-se em passadiço, então solicita pouso e alimentos, a tarde já fria em breve se fará noite, diz em timbre de gravíssima beleza.
São seres manipuladores do sacro que rogam pragas, e Peter, num rompante, captura a velha égua reformada. Apesar da acastelada estima ao equídeo, esquivar-se-á de riscos.
Ufa! Foi-se a criatura, desajeitadamente montada a pelo, com um embornal de vitualhas preparado por Colen. Ganha a estrada nas jocosas vestes esvoaçantes e apaga-se dentro da poeira.
Tal inconveniência fez com que o guardado Peter, pela primeira vez, arrastasse um discurso desnecessário com Blanche, enquanto sobem a montanha. A curiosidade o impeliu.
Ela aclara que quando eclode um indiozinho especial, que se distingua por um dom ou sinal físico, abre brecha para observação dos pajés, naqueles olhos indecentes que não piscam. 
Em torno dos nove anos, quando os garotos indígenas cruzam uma espécie de adolescência, o "especial" é arredado da família e instado na caverna de um ancião iniciado. Pavor e deslumbramento.
As abrasadas lágrimas da mãe, tingem-lhe o rosto em prata, na estranha éticazinha que mistura emoções. Saboreia um caldo fino de alegria na profunda crueldade desta desominização.
Sua iniciação na seita dos psicopompos durará o ciclozinho de um ano, com todos os ensinamentos e ritos necessários, quando fará estréia da dopagem, hora após hora, para a posterior orquiectomia.
Por quatro luas completas, será fomentado com líquidos vegetais, em caverna escura, e com fungos estupefacientes, chás alucinógenos, incensos lisérgicos e outros opioides (venenos de insetos, sapos).
Com a lua cheia subindo a trote, o séquito de magos, em bafejantes sorrisinhos bravios, se dirige ao local abençoado em meio à floresta, com ungida faca de sílex soberba e autoritária.
Num ligeiro golpe, um sectário sem critério de vida, retira o pênis e saco escrotal da criança, que já se encontram amarrados com finíssimo cipó, para deter a corrente sanguínea.
O próprio brado ensurdecedor desperta o incipiente eunuco do transe, e o devolve desmaiado sobre o rochedo sacrificial, recoberto por emblemáticos petróglifos miudinhos, que se assustam com a cena.
Um canudo de madeira oca é instalado no orifício penial para que a urina flua. Em maca, o garotinho, com o atônito no rosto, retorna à caverna pela madrugada, a comitiva entoando cânticos exotéricos. 
Em constante vigília, curandeiros comutam emplastros, concebem banhados e ministram chás anti inflamatórios, mantendo a dieta frugal, e o estado estupefato do menino, até que recupere as forças e se emaranhe na enantiodromia. 

2 comentários:

  1. Não percebi muito bem a tua história,falas com palavras caras que eu mal entendo o seu significado. Nunca ouvi falar em eunicos,depois a parte final do pénis e da virilha não cheguei a entender nada. Bem,o que eu quero é desejar-te uma excelente semana!! Muitos beijinhos,fica com deus e até breve!! http://musiquinhasdajoaninha.blogspot.pt

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  2. Oi, Joaninha! Que bom você aqui!
    Eunucos, neste caso, são homens castrados com finalidade espiritual. Um hábito desta tribo indígena, com ritual macabro em busca de transcendência.
    As palavras rebuscadas fazem parte da filosofia do conto, um dos objetivos é elevar o leitor a outro patamar, indo além do entretenimento.
    Faz-se necessário a leitura do conto por completo, com calma, para se atingir a essência da obra.
    Volte e me acompanhe, post por post!
    Beijos prá ti também, e uma semana iluminada.

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