27.12.13

Blanche 23: Rotina e alimentação

Também para as prestimosas damas com seus olhos cuidadosos no importante auxílio infantil, a rotina semanal é bem demarcada na comunidade Riolama, após a introspecção e encalacrado repouso dominical. 
Às segundas e quintas-feiras, com a madrugada empurrando o dia, lavora-se com toda a roupagem: Lavar, ferver, passar, engomar, coser, cerzir, remendar, tingir, fiar, tecer. Os coloridos varais balançando-se ao vento, gritam a paisagem.
Às terças e sextas-feiras, a incumbência é com a vivenda: faxinar, repor o (indispensável) estoque de lenha, fazer reparos, confeccionar cestaria, utensílios em terracota, ornatos, manter a horta, jardim e pomar. As crianças tagarelas seguem enfileiradas morro abaixo, cada qual com seu despenteado feixinho de lenhas à cabeça.
As quartas-feiras são reservadas para deliciosos trabalhos ocasionais: pescar e salgar, abater animais e ocupar-se da carne: defumar, preparar embutidos, acondicionar em recipientes de terracota, selados com gordura, fritar torresmos. O aroma viaja denunciante.
Também às quartas, manufaturar sabão e açúcar mascavo, preparar compotas com frutas de época (silvestres ou cultivadas), deixar as passas secando ao sol, montar réstias de legumes e especiarias, desidratar ervas e temperos, preparar picles para o inverno. A criançada afasta as galinhas. 
Os sábados são reservados aos banhos dos entes familiares, o que requer armazenamento extra de água, aquecimento, colheita de flores para aromatização da água (pois o sabão de cinzas é fétido), vestimentas limpas para vestes e para as camas, toalhas rústicas, revezamentos no barril do banho. Um fuá.
Nesta comunidade distante, não se faz quitutes ou pão, pois a farinha de trigo, com seu manancial de lucratividade, ainda não é encontrada. Nem mesmo se planta o arroz para encher a terra de satisfação.
A auto suficiência faz com que adquiram o sal e façam escambos entre si. Guloseimas industrializadas são raramente presenteadas às crianças, e quando ocorrem, chegam trazendo sorrizinhos. 
Utiliza-se os carboidratos da mandioca, do cará (a variedade cará-moela é silvestre), batatas diversas e outros tubérculos, abóboras variadas, inhame, milho, e frutas “carnudas”, como banana da terra e abacate, fartos feito moça cortejada.
As farinhas de alguns desses produtos, são preparadas artesanalmente, para utilização criativa na culinária local: fubá, farinha de mandioca, de cará, amido. Enquanto as mães trabalham, filhos montam em seus movimentos.
O mingau, com o casamento das várias farinhas, às vezes enriquecido com legumes ou passas, é prato trivial, sempre equilibrado no doce ou no sal, servido na refeição matinal ou no lanche de sol a pino. Vem fumaceando no seu quentinho aromático.
Com a aproximação do inverno e constantes geadas (ou até neve de quando em quando), as hortas são desfeitas e legumes armazenados no sótão, para se desidratarem e aturarem o tempo frio. A fragrância leva a um respirar prensado pelo encanto.
Blanche detém receitas repassadas pela avó indígena, utilizando folhas, raízes, frutos e tubérculos coletados nas encostas e pouco conhecidos pela população branca. A sopa vai se acaldando no todo de seu capricho.
Os indígenas somente faziam duas refeições diárias: ao amanhecer e ao anoitecer, porém com a chegada de novas culturas, caminharam nos furtivos que julgavam passageiros e um leve lanche foi adicionado à dieta, bem ao sol a pino.
Nos anos de grande seca, ou de inverno rigoroso, volta-se à aflissurada dieta de duas refeições, inclusive para a população não índia. E nestas acuações crescem um pouco mais dentro de si mesmos.

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